Agricultores e pescadores de Peruíbe temem impactos da termoelétrica
Em licenciamento na Cetesb, usina prevista para o município vai produzir chuva ácida, que afeta as plantações. E deverá elevar a temperatura do mar, levando à morte de peixes e algas
As hortaliças produzidas em Peruíbe atendem 30% da merenda escolar do município, além da venda em feiras e restaurantes.
São Paulo – Os agricultores e pescadores de Peruíbe, no litoral sul paulista, estão preocupados com o possível licenciamento, pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) da usina termoelétrica de propriedade da Gastrading prevista para o município. Eles temem os efeitos das substâncias tóxicas que serão lançadas na atmosfera, causando chuva ácida, e o aumento da temperatura marinha na região.
O agricultor e presidente do Conselho de Desenvolvimento de Agricultura e Pesca de Peruíbe, Laerte Melo, não tem dúvidas de que o funcionamento da usina vai afetar a produção agrícola.
"A base da agricultura é a água. Uma água ácida, com componentes tóxicos, não vai se traduzir em benefícios nem para a planta e nem para quem se alimentar dela", diz o produtor, que tem uma pequena propriedade na qual trabalha com seus familiares. Ironicamente, ele havia ido à Assembleia Legislativa paulista encaminhar a parlamentares um projeto para aumentar a produção de hortaliças, na última quarta-feira (30), data em que foi realizada audiência pública para discutir os efeitos da usina.
Embora o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) apresentado pelos donos do empreendimento não fale em efeitos das substâncias tóxicas sobre os ecossistemas, a engenheira química e professora dos cursos de Engenharia Florestal e Agronomia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Sonia Corina Hess, faz o alerta.
"É amplamente descrito na literatura científica que, na atmosfera, os óxidos de nitrogênio (NOx) e de enxofre (SOx) são convertidos em ácido nítrico (HNO3) e ácido sulfúrico (H2SO4), respectivamente, que são os principais ácidos que compõem as precipitações ácidas (chuva ácida)", explica a professora.
De acordo com ela, que é autora de um parecer solicitado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, as precipitações ácidas – chuva, névoa e neve, entre outras – causam danos severos aos ecossistemas naturais e agrícolas.
Mapa da localização da usina que a Gastrading quer instalar em Peruíbe.
Entre eles, a perda da fertilidade e desestruturação do solo devido à lixiviação de matéria orgânica, cálcio e magnésio; o aumento da concentração no solo de alumínio, que é tóxico; a corrosão de folhas, caule e raízes superficiais das plantas, diminuindo a resistência a doenças, além da perda da fertilidade, da capacidade de crescimento e, até, a morte. Esses impactos à vegetação podem ainda levar à extinção de espécies vegetais e também animais.
Produção
Atualmente, a produção agrícola de Peruíbe responde por 30% das hortaliças e legumes da merenda escolar no município. Além desses itens, são produzidos ainda banana e palmito de pupunha. "É relativamente pouco para o município, mas vendemos ainda de porta em porta, para restaurantes, na feira e essa produção não entra nos 30%. E agricultura gera renda, empregos."
Há cerca de 20 dias os produtores deram início à abertura da Cooperativa Familiar dos Agricultores de Peruíbe e Região. A documentação já está na Junta Comercial.
Em relação à atividade pesqueira, o relatório da Gastrading fala em impacto negativo.
No entanto, o presidente do Conselho de Desenvolvimento de Agricultura e Pesca de Peruíbe teme elevação da temperatura da água do mar na região. Segundo ele, é esperada elevação de cerca de 3 graus Celsius na temperatura da água com a ação do terminal off shore, que a 10 quilômetros da praia vai tornar gasoso o gás liquefeito, às tubulações que vão levar esse gás para a usina, perto da praia e aos próprios geradores de energia da usina.
"Com esse aumento estimado, poderá haver impacto sobre as algas e sobre os peixes, trazendo desequilíbrio na cadeia", diz Laerte Melo.