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ONGs alertam contra ameaças a liberdades fundamentais no Brasil

Em encontro, entidades ambientalistas e de direitos humanos denunciam escalada dos ataques a ativistas, organizações e povos indígenas no país. Prisão de brigadistas no Pará é o mais recente exemplo, afirmam

"A retórica do governo cria um ambiente de vulnerabilidade para ONGs", diz diretora da Anistia Internacional

Diferentes organizações de defesa dos direitos humanos, do meio ambiente, da sustentabilidade e da democracia se reuniram nesta terça-feira (03/12) para alertar contra a escalada dos ataques sofridos por entidades, ativistas e movimentos sociais durante o governo de Jair Bolsonaro.

Durante o encontro, os grupos expuseram preocupações com ameaças a liberdades fundamentais e se manifestaram contra medidas recentes tomadas por órgãos oficiais contra organizações da sociedade civil, denunciando falsas acusações e prisões arbitrárias baseadas em provas infundadas.

A diretora-executiva da Anistia Internacional no Brasil, Jurema Werneck, abriu a mesa dizendo que o caso dos brigadistas presos recentemente no Pará é apenas o exemplo mais recente do clima de animosidade entre governo e organizações da sociedade civil.

"A retórica do presidente e de outras autoridades do governo cria um ambiente de extrema vulnerabilidade para ONGs, ativistas e defensores de direitos humanos, que não estarão a salvo enquanto autoridades públicas não garantirem o direito de livre expressão e manifestação", afirmou Werneck, lembrando que a Anistia Internacional tem observado processos semelhantes em outros países, como Índia, Hungria e Rússia.

"[É uma] ferramenta extremamente violenta, inadequada e inconstitucional de limitar o direito de protesto. A ideia é repetir os péssimos exemplos do Chile e Hong Kong, onde o direito de se manifestar não é preservado, e ativistas são atacados, com uma grande quantidade de feridos e mortos", disse Werneck.

A advogada Camila Marques, da ONG Artigo 19, reforçou o discurso ao declarar que, "historicamente, o Estado brasileiro reprime e restringe os direitos de associação e expressão". Na visão dela, desde as grandes manifestações de 2013 os governos têm se empenhado em criminalizar movimentos sociais.

"O Executivo vem investindo em novas técnicas e táticas de repressão. Nunca vimos agências de inteligência, polícia e serviços tão ativos no monitoramento e na vigilância de movimentos sociais. Estamos diante de um cenário de prisões arbitrárias e frágeis.

O sistema de justiça chancela e legitima um cenário de criminalização", ressaltou.

Em 26 de novembro, quatro voluntários da Brigada de Alter do Chão, uma ONG que começou a atuar no combate a incêndios na Amazônia em 2018, foram presos acusados de provocar incêndios propositais em Alter do Chão, um distrito de Santarém, no Pará, para se beneficiar com doações de dinheiro de ONGs.

Também foram executados mandados de busca e apreensão nas sedes de três ONGs, incluindo o Projeto Saúde e Alegria, organização que já recebeu vários prêmios por sua atuação na Amazônia. O inquérito vem provocando questionamentos por não incluir perícias, testemunhas ou evidências. Em meio à enxurrada de críticas, a Justiça mandou soltar os brigadistas presos.

"O que ocorreu em Santarém é um teste ao limite democrático", afirmou, por sua vez, Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, ao comentar as queimadas em áreas de proteção ambiental no Pará as quais os brigadistas foram acusados de provocar.

"A impunidade recebe um acolhimento maior quando se ameaça a sociedade civil. Desta forma, o Brasil vai perder mercado. Porque reputação e imagem nós já perdemos", disse ele.

Caetano Scannavino, coordenador do Projeto Saúde e Alegria, complementou: "Não é de agora, no governo do senhor [Bolsonaro], que a Amazônia está pegando fogo. Faz 30 anos que isso está acontecendo. Não acho que o senhor, que foi eleito legitimamente, queira colocar fogo na Amazônia. Mas devemos agir com responsabilidade."

Ameaça aos direitos indígenas

Organizações que defendem os direitos indígenas na Amazônia também relatam ameaças e denunciam o aumento da violência contra esses povos. Segundo a líder indígena Sônia Guajajara, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), de janeiro a novembro ocorreram mais de 160 casos de ataques e invasões de territórios indígenas no país.

"Uma coisa é certa: estamos vivendo um cenário de guerra. E a certeza da impunidade fortalece essa violência", afirma uma nota escrita pela líder e lida pelos participantes do encontro.

No texto, ela diz ainda que os indígenas foram os primeiros atingidos pela MP 870, primeira medida tomada por Bolsonaro como presidente e que reorganizou os órgãos estatais, os ministérios e suas atribuições. Segundo Sônia, a MP "esfacelou a Funai e tentou empurrar as pastas da demarcação de terras indígenas e licenciamento ambiental para o ministério do agronegócio".

Ela se refere à tentativa do governo de transferir a Fundação Nacional do Índio (Funai) ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, bem como a competência de demarcar terras indígenas ao Ministério da Agricultura. "Fizemos muita luta e mobilização e conseguimos reverter legalmente por meio de votação no Congresso Nacional", lembra.

"Porém, não quer dizer muita coisa, pois a Funai está sendo aparelhada para perseguir lideranças, lotear e arrendar terras, negar atendimento aos indígenas que não estão em área regularizada, e muitos povos em isolamento voluntário também ficam abandonados por meio de decreto", acusa.

As palavras de Sônia foram corroboradas pela advogada do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos Juliana Vieira dos Santos: "O discurso do presidente Jair Bolsonaro tem como consequência atitudes violentas e ataques a populações indígenas e entidades."

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