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População luta contra a privatização da água no sul mineiro

Em guerra contra autarquia do governo de MG, ONG Nova Cambuquira quer barrar projeto de parceria-público privada. Temor é que concessionária seque fontes, como fez a Nestlé em São Lourenço

Guardiões das Águas: Manifestação em defesa dos recursos hídricos e contra a privatização

A Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig) realizou na manhã de hoje (27) pregão para escolha da proposta mais vantajosa para selecionar parceiro privado para a exploração do negócio de águas minerais nas unidades de Caxambu e Cambuquira, no sul mineiro. A empresa vencedora é a Maximus Prestação de Serviços, uma microempresa que atua no ramo de construção civil, limpeza de prédios, imunização e controle de pragas, entre outras. A perdedora – Original Sucos e Águas Minerais – vai interpor recurso. Entre os argumentos, uma regra do edital que exige compatibilidade entre o objetivo social da empresa e o objeto licitado.


Para integrantes da organização ambientalista Nova Cambuquira, o edital que desrespeita a vontade da maioria da população e está repleto de irregularidades, ilegalidades e contraria até recomendações internacionais é um tiro no próprio pé. "A Codemig descumpriu liminar que impediu o pregão do dia 20 e que continua vigorando e realizou novo pregão. Além disso, elegeu empresa, cujo objetivo social diverge totalmente da proposta do edital, além de outras ilegalidades e irregularidades que ocorreram durante todo o processo", disse o integrante da ONG, Marcos Rodrigues.


Uma enquete da EPTV Sul de Minas, realizada em março, já indicava que 77% dos participantes eram contrários à parceria público privada para explorar águas minerais em fontes de Cambuquira e Caxambu.


Conforme o ativista, o julgamento da Ação Cível que a ONG iniciou contra o edital será retomado no retorno do recesso de fim de ano. "Tudo indica que esse processo todo será revertido. Há inclusive a possibilidade de a Codemig ser financeiramente punida, já que todos os efeitos iniciados após a ação judicial deverão ser revertidos em um efeito dominó", disse.


Guerra da água

No último dia 4, a Nova Cambuquira ingressou com ação preparatória de ação civil pública ambiental com pedido de liminar. No dia 19, em que a Codemig contestou a ação, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais emitiu parecer favorável à organização, endossando a tutela de urgência para suspensão do pregão. No dia 20, a juíza plantonista Fernanda Machado de Moura Leite, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, acatou o pedido de liminar. No entanto, a Codemig recorreu e o desembargador Kildare Carvalho cassou a decisão da magistrada, encaminhando o caso para a Justiça Federal.


A guerra da água contra o projeto da Codemig, foi declarada em defesa da manutenção das fontes e dos parques pelo poder público. No entendimento da população, a água é mais que recursos hídrico: é alimento e recurso terapêutico, que deve ser acessível a todos. E a parceria público-privada é meio caminho andado para a privatização, já que que a participação pública no negócio pode ser reduzida a ponto de o parceiro privado ser o controlador.


"Nós defendemos as fontes pela importância histórica e cultural das águas minerais para a nossa população, para os moradores de Cambuquira, Caxambu e região, que continuem ao alcance de todos. Queremos gestão participativa, participar das decisões. Não queremos decisões unilaterais, arbitrárias. Queremos desenvolvimento, mas um desenvolvimento sustentável, nos conformes da construção da nossa cidadania, que respeite a soberania do nosso povo, e não o desenvolvimento para alguns, mas sim, para a construção de nossa cidadania. Não queremos um desenvolvimento em que só poderá ter acesso à água quem puder pagar, quem puder pagar por uma garrafa", diz Marcos Rodrigues.


Fonte secou

Segundo o ativista, a população teme que as fontes das estâncias hidrominerais de Cambuquira e Caxambu tenham o mesmo destino das de São Lourenço, privatizadas há 25 anos. "Das três fontes controladas pela multinacional Nestlé, duas secaram devido ao modelo de exploração que retirava 1 milhão de litros por dia. E a outra foi interditada pela Justiça. Além disso, houve afundamento no solo do parque, no qual é cobrado ingresso no valor de R$ 10".

Conforme ele, há a desconfiança de que por trás da privatização das fontes de água mineral estejam projetos mais ambiciosos, como fornecimento de água para cervejarias, por exemplo.


No final de março, a ex-conselheira da Assembleia Geral da ONU, a canadense Maude Barlow enviou carta ao governador Fernando Pimentel solicitando a interrupção de projetos de privatização do Circuito das Águas de Minas Gerais. Considerada uma das referências mundiais no estudo e preservação da água, ela defende a água como patrimônio público, e não mercadoria.

"A demanda por água vai superar a oferta em 40% em menos de uma década, e por isso é preciso proteger as reservas hídricas como um patrimônio público e um direito humano. E não enxergá-las como mercadoria. É preciso preservar essas fontes pelo bem das próximas gerações", escreveu, em sua carta.


Desde 2001, os moradores das duas estâncias hidrominerais lutam pela incorporação da água no rol dos recursos terapêuticos – o que já é conhecido desde a Antiguidade, mas que acabou marginalizada a partir do fortalecimento da indústria farmacêutica. Tanto que o SUS já reconhece a crenoterapia, tratamento feito por meio de ingestão e banho de águas minerais, como prática complementar e integrativas.


Por meio de nota enviada pela assessoria de imprensa da Codemig, a licitação não busca privatizar fontes e parques e, sim, estabelecer uma parceria produtiva com sócio apto a assegurar a execução do serviço com qualidade, além de valorizar a eficiência na prestação dos serviços à população e maximizar o retorno econômico para o estado e a sociedade, considerando sempre a gestão eficiente dos recursos públicos e a geração de emprego e renda.


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